
A VIDA COMO ELA É
As decisões de gabinete tomadas no âmbito do Poder Público, sob o frescor do ar condicionado, carecem do calor da vida nas ruas – da vida como ela é.
Dona Izabel da Costa, 62 anos, na manhã do dia 13 de junho teve suas mercadorias apreendidas - 10 chocolates sulflair, 24 "choquitos" e alguns pacotes de alho.
Bem antes disto, o Sr. Benedito Miranda, 58 anos, teve sua barraca e seus bens apreendidos numa ação da Prefeitura para "limpar" a área de acesso ao terminal. Seu irmão, Paulo Miranda, vendia sonhos. Foi humilhado e teve sua mercadoria apreendida.
Dona Madalena Miranda vendia cintos e carteiras. Teve sua banca, os cintos e as carteiras apreendidas.
Foram, todos eles, por um ato do Poder Público, alijados de seu ganha-pão, sem que se lhes fosse oferecida outra alternativa.
Sem emprego, Dona Madalena amarga a dura realidade de fazer frente às necessidades básicas de sua família.
Pior sorte (?) teve o Sr. Benedito. Sem mais poder vender suas mercadorias e obter seus parcos rendimentos, endividou-se. Preocupado com o "nome sujo", não dormia de preocupação. No último dia 17, o Sr. Benedito faleceu vítima de infarto do miocárdio.
Paulo Miranda vendia “sonhos”. Tinha, certamente, seus sonhos. Seus “sonhos” foram apreendidos e seus sonhos abortados pela truculenta fiscalização. Hoje, encontra-se internado em um hospital psiquiátrico na cidade de Piedade. Sem sonhos.
Essas pessoas, com certeza, se encantam com a beleza dos canteiros centrais das avenidas de nossa cidade, com sua grama esmeralda e suas flores... porém, precisam comer, dar de comer aos filhos, para sobreviver e até para manter seus sonhos.
Gabriel Bitencourt
(Escrito pelos idos de 1997, sobre fatos reais)